A doença de Lisboa é, ao que ouvimos, amor de mais. Todos a amam! E todos, por amor, a querem! Só que, guindados a posições que lhes permitiriam exteriorizar o seu amor, esquecem-se rapidamente das promessas que tornaram bem sucedido o namoro e exibem um casamento desastroso.
Lisboa, que foi durante décadas a cidade mais limpa e bem cuidada da Europa, Lisboa, cuja história e "maravilhas" eram periodicamente enaltecidas em exposições, festejos e brilhantes recepções a dignitários estrangeiros, Lisboa, cujos parques, jardins e cintura florestal eram cuidadosamente preservados, Lisboa cujo urbanismo, aprecie-se ou não, era cuidadosamente pensado, é hoje um objecto de ganâncias de toda a espécie: ganâncias de Poder, ganâncias de lucro fácil, ganâncias de efémeras glórias e instalados oportunismos.
Costumo, sempre que posso assistir a "Prós e Contras". Não gosto do nome do programa, não aprecio especialmente o modo como Fátima C.F. trata os convidados, mas admiro a honestidade com que ela prepara o programa e o conhecimento que mostra dos temas em análise.
Ontem, apesar de não ter assistido a todo o programa, registei algumas das "preocupações" exteriorizadas e fiquei a saber que:
- segundo Paulo Varela Gomes as pessoas não frequentam os museus porque o actual urbanismo não contem parqueamento automóvel em abundância junto aos mesmos! Fiquei admirado por três razões: almoço frequentemente ao domingo no museu de Arte Antiga e reparo que o restaurante e o jardim estão sempre cheios; tenho visitado os museus de todos os países onde me tenho deslocado e tenho-me servido sempre de transportes públicos ou taxis (conforme a capacidade financeira do momento); admira-me que alguém que "ame" Lisboa faça depender o gozo das suas ofertas do uso do automóvel que, como é sabido, é o maior inimigo das cidades
- todos os intervenientes pareciam sofrer de uma espécie de autismo em relação à lastimosa situação financeira a que a CML chegou. Já não bastava ignorarem os gastos e endividamentos feitos pelo PS , endividamentos que permitem a João Soares gabar-se da obra feita, as admissões por compadrios políticos e de grupo que fizeram ascender os compromissos com pessoal a níveis incomportáveis, esquecer a alucinação do espécimen Sá Fernandes que, para além dos incómodos causados, fez resvalar a verba e a data da aberturao túnel do Marquês -que acabou à mesma por ser feito e já há muito quem se congratule com a obra - ainda há quem faça faraónicas propostas "a latere", como tudo estivesse pelo melhor no melhor dos mundos
E fiquei sem saber porque razão nada do que todos parecem saber que devia ter sido feito, nunca até agora foi feito!...
Em Lisboa, como em Portugal, nas últimas décadas tudo ficou por fazer. Apesar das 900 toneladas de ouro que Salazar - que nunca terá feito declarações de amor a Lisboa - deixou nos cofres do Banco de Portugal e das verbas indescritíveis que a União Europeia canalizou para cá durante todos estes anos.
Onde parará - em que bolsos, em que contas, em que bancos, em que "lavandarias"?? - esse tesouro malbaratado? Não sabemos! Ninguém sabe! Ninguém se importa!
Uma coisa é certa: Salazar não levou nada com ele...
Enquanto isso, Portugal preocupa-se com as ninharias com que a comunicação social o entretem: as opiniões de políticos "en attente" que se vão governando e mantendo viva a imagem com essas tarefas; os "casos" que os media trazem e mantêm à superfície e que só valem na medida em que são notícia - já não são os factos que fazem as notícias, mas as notícias que "fazem" os factos... -; os infortúnios criteriosamente escolhidos que, despudoradamente, se destacam de outros de igual densidade humana a que ninguém ligou nenhuma ; a ânsia desmedida de fazer cair qualquer tentativa de governação.
Desgraçado povo que, a continuar assim, nem a condescendência divina merecerá!